10 novembro 2009

Laputa: Castle in the sky




Desde as primeiras cenas que fica claro o virtuosismo visual do criador, e o alto nível estético: música e imagem combinam-se para momentos de impressionado silêncio na sala. Em auxílio deles vem um domínio dos ritmos narrativos impecável. O filme respira: inspira em cenas de acção bem esgalhadas, e expira em momentos pacíficos e de harmonia entre as personagens e o ambiente (a felicidade dos protagonistas quando alcançam Laputa transborda do ecrã). A destreza no controlo da velocidade da narrativa é uma segurança contra o aborrecimento, a riqueza visual (e musical) é uma garantia de admiração.
Do outro filme do realizador que vi, A Princesa Mononoke, à parte da impressão forte de ecologismo, não me lembrava de nada. A minha fraca memória foi suficiente para não me surpreender: todas as personagens boas, nobres, de Laputa vivem em harmonia com a natureza na sua vida humilde numa pequena aldeia de mineiros encravada na montanha. Os maus, os corruptos, estão rodeados de tecnologia e têm qualquer coisinha de Gestapo*. Um atalho simples para descodificar as personagens do filme de Miyazaki é sobrepor um espectro moral ao tecnológico: num extremo os humildes mineiros pré-industriais, no outro os facínoras que voam em fortalezas; no centro os piratas, que abandonam a caça aos protagonistas para os ajudarem: apesar de terem um veículo voador, é feito de pano, e nem sequer sobrevive ao filme. Pelo antibelicismo e ecologismo (menos evidente do que em Mononoke), pela condenação da ganância e ambição, pela associação entre o mal e a tecnologia, Laputa é um filme hippie. Tal como os hippies não vai mudar o mundo e causa boa disposição, mas distingue-se deles por não cheirar mal.

*Miyazaki é exímio no saque de um imaginário comum para a criação do mundo alternativo: as minas, as máquinas a vapor e os comboios, que identificamos como artefactos da Revolução Industrial, convivem com castelos e navios à vela ainda mais velhos e armas e helicópteros, que nunca tendo existido, todos conhecemos de outras fantasias.

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